O que é isso do mundo de língua portuguesa? É complicado. Como português, educado em Portugal, bem doutrinado na narrativa histórica portuguesa, tenho muito orgulho nos meus antepassados que desde aquela pequena nação, com meios rudimentares, conseguiram navegar todo o globo, iniciando o processo que tornou o nosso planeta na pequena aldeia que é hoje. Mal consigo imaginar a determinação e coragem destes marinheiros que aceitavam fazer viagens que duravam anos para ir e voltar, deixando atrás famílias, filhos que nunca veriam crescer, e que muitos não veriam nunca mais. Estes homens, e eram principalmente homens, iam para terras longínquas em pequenos barcos, convencidos de enfrentar monstros marinhos e outros horrores, mas mesmo assim aceitavam o desafio com uma coragem que é difícil de imaginar hoje. Sim, tenho muito orgulho nestes homens de que ninguém sabe o nome, que não estão nos livros de história, de quem não há estátuas e para quem não existem celebrações. Tudo isto não me impede de também entender que, ao mesmo tempo, todo o processo de expansão marítima foi tomado pelos interesses comerciais e financeiros de uma elite que rapidamente transformou toda a empresa num mecanismo para se enriquecer, completamente amoral e imoral. A minha crítica às navegações, expansão, invasão, achamento, descobrimentos, colonização (escolha o seu veneno) não é um desacordo com os princípios das navegações -de procurar novos mercados e parceiros comerciais-, mas o desacordo com resultados específicos das navegações, consequência de uma ganância burguesa sem limites. Por causa dela, como empreendimento, as navegações foram também uma empresa inerentemente de exploração, instável, insustentável que criou enormes desigualdades tanto em Portugal quanto nos espaços que colonizou, mercantilizando pessoas, espalhando uma estrutura socio-económico-política fundamentalmente antidemocrática, que levou à suspensão de direitos humanos num processo de expansão imperialista. Isto não é julgar o passado de acordo com valores do presente; isto é puramente descritivo. É significativo que incomode quem se sente julgado pela descrição de uma realidade histórica, mas o significado desse incómodo é algo que os incomodados têm que resolver sozinhos, na certeza de que são as narrativas que se ajustam à realidade, não é a realidade que se ajusta às narrativas.
Isto tudo para dizer que o mundo de língua portuguesa, ou os espaços em que a língua portuguesa é utilizada como meio de comunicação, existe. Esse mundo da língua portuguesa é uma realidade. Sim, resulta de muita coragem e esforço, mas também resulta do sangue, suor e lágrimas de milhões de pessoas, de repressão e opressão, de violência e genocídio de populações inteiras, estupro, morte… que se manifesta em injustiças sociais, preconceitos e outras formas de discriminação que ainda se manifestam hoje. Isto pode ofender quem prefere focar nos “aspectos positivos” do processo imperial, e também pode ofender quem se aproxima ao assunto para reafirmar narrativas nacionalistas dos seus países, por acharem que não descreve a verdadeira profundidade das violências coloniais – falhando em reconhecer que estas narrativas nacionais existem para purgar essas sociedades da responsabilidade de terem sido elas mesmas as agentes dessas violências que tanto abominam. Não há santos nesta história.
Assim, o mundo de língua portuguesa resulta de um processo profundamente violento e há muitas consequências e violências que ainda vivemos hoje como resultado desse processo, mas, o mundo de língua portuguesa é uma realidade. Está aqui! Podemos ter uma conversa sobre o que poderia ter sido e como poderia ter sido, e o que deveria ser agora não fosse pelo que se passou, mas o processo histórico só se vive uma vez, e a única realidade sobre a qual temos agência é o presente, na esperança de criar um futuro em que todos os seres humanos tenham a oportunidade de concretizar a sua plenitude. Ou seja, a pergunta é: o que fazemos com este mundo de língua portuguesa e como gerimos a língua que compartilhamos de uma forma que não reproduza as violências do passado? E a resposta não pode ser soluções do século XIX para resolver problemas do século XXI.
É impossível trabalhar com o ensino de língua portuguesa no século XXI, seja em que contexto for, língua materna, língua de herança, segunda língua ou língua estrangeira, sem levar em consideração dois aspetos: o seu caráter pluricêntrico e a sua variação linguística. A língua portuguesa é uma língua intercontinental, que nos diferentes espaços que ocupa tem diferentes papéis, ora como língua nacional, ora de língua oficial, língua de contacto, língua de administração etc. Além disso, em cada um desses espaços, a língua portuguesa é diariamente reatualizada dentro de culturas específicas, com estruturas sociais particulares, que ocupam espaços geográficos específicos e vivem em contato e permuta histórica ou diária com outras comunidades falantes de outras línguas com as suas próprias culturas. Em cada uma destas muitas comunidades de falantes de português espalhadas pelos países de língua portuguesa, em algumas outras regiões do mundo e nas diásporas, estas especificidades locais têm impactos no sistema da língua portuguesa, ao serem codificadas e incorporadas na própria língua.
Não há qualquer dúvida que como língua pluricêntrica, a língua portuguesa tem mais de um polo que produz uma norma-padrão da língua. Também é incontestável que neste momento Portugal e o Brasil representam os dois polos dominantes, no que promete vir a ser uma constelação de polos, ao vermos as variedades angolanas e moçambicanas estabelecerem as suas próprias normas.
Por outro lado, dentro de cada um destes polos, é preciso reconhecer que existe uma rica variação interna que não é sempre reconhecida nem no processo educativo nem pela sociedade em geral. Assim, tradicionalmente, a norma-padrão da língua é privilegiada e prestigiada, e todas as outras variedades da língua são consideradas erradas e a intenção é eliminá-las através da correção do “falar e escrever errado”. Isto não significa que os agentes deste ensino tradicional eram/são pessoas horríveis que trabalharam/trabalham para mutilar linguisticamente populações; simplesmente significa que trabalharam/trabalham com as melhores das intenções para dar aos seus alunos acesso à norma-padrão, acreditando ser esse o passaporte para a mobilidade social e o sucesso profissional. No entanto, como muitas questões em relação à língua, hoje sabemos que esta posição é um equívoco e deve ser rapidamente revisitada. O ensino da língua materna, neste caso a língua portuguesa, não deve, não pode, não precisa ser feito com o propósito de erradicar o “errado” quando esse “errado” é na realidade uma variante local ou regional da língua. Temos que começar, urgentemente, por abrir mão da sobreposição fácil entre "comunidade de falantes" e "fronteiras nacionais" – até porque nenhuma língua tem essa correspondência. Dentro de cada país existem, na realidade, muitas comunidades de falantes da mesma língua que têm caraterísticas próprias. O papel da escola não é erradicar as diferenças em favor da norma-padrão; o papel da escola é agregar a norma-padrão ao repertório de opções que os alunos já trazem para a aula e dar aos alunos o conhecimento para que eles façam as escolhas adequadas de acordo com o contexto e o propósito no momento de comunicação. Isto tem também implicações importantes para a aula de português como língua estrangeira (PLE). Não é o papel dos professores de PLE ensinar exclusivamente a norma-padrão da língua portuguesa; pelo contrário, é promover o conhecimento da variante local utilizando documentos reais escolhidos de acordo com o objetivo dos alunos. Ou seja, não podemos escolher os mesmo documentos reais para os alunos que vão trabalhar com a indústria de energias renováveis em Portugal e para os que vão trabalhar com engenharia aérea no Brasil, com a produção de cacau em São Tomé e Príncipe ou a produção de café em Timor-Leste – sempre que possível, temos que trabalhar com os documentos adequados aos objetivos de cada aluno. Ou seja, nestes documentos reais, filmes, jornais, músicas, youtubers, memes, formulários, etc. não vai aparecer sempre a norma-padrão da língua; a variação linguística vai entrar na sala de aula, da mesma forma que entrará nos atos de comunicação dos alunos assim que eles chegarem aos espaços para onde vão. Os alunos devem estar preparados para comunicar adequadamente, reconhecendo a variedade local e tendo consciência das opções disponíveis para fazer escolhas significativas para uma comunicação mais eficaz, e para isso a nossa metodologia de ensino tem que convidar, ou intimar, os alunos a terem uma mente aberta para a variedade. Isto não vai acontecer se os professores não derem o exemplo desta postura interculturalmente competente, por isso, o trabalho desenvolvido pelos professores deve ser um modelo de inclusão, respeito e curiosidade pela diversidade linguística dentro do seu pais (variação) e através dos países de língua portuguesa (pluricentrismo).
Para os professores de PLE e para os professores de português como língua de herança (PLH), a situação pode ser mais complexa que para os professores de português como segunda língua. Com as diásporas dos países de língua portuguesa pelo mundo, não é raro estes professores trabalharem em contextos onde existe uma significativa comunidade de falantes de português de vários países de língua portuguesa, e que consequentemente refletem as variedades dos vários espaços de língua portuguesa e a variação dentro de cada um desses espaços. É impossível não reconhecer que, em termos dos diferentes polos, existe uma rivalidade indiscutível pela predominância, particularmente entre Portugal e o Brasil, e que nos espaços onde as diásporas se encontram, existe uma reprodução dessa rivalidade e a repetição acrítica, muitas vezes dissimulada de delicadezas nacionalistas, de ideias preconceituosas e xenófobas em relação ao outro. Por outro lado, é impossível não reconhecer também que existem preconceitos dentro dos próprios espaços de língua portuguesa em relação a determinadas variantes e aos falares de comunidades geralmente longe dos centros de poder, e essas atitudes discriminatórias viajam e usam exatamente os mesmos meios de transporte utilizados pelas pessoas na imigração e se tornam presentes e reiteradas ad nauseam nas diásporas. Os professores de PLE e PLH têm que ter na sua bagagem uma formação que leve a uma atividade a favor da diversidade e variação linguística e cultural. Isto não significa que os professores se devem lançar no estudo de todas as variedades possíveis, até porque muitas delas carecem de descritores. O que isto significa é que os professores de português devem sim conhecer as diferenças entre as variedades mais comuns, mas sobretudo, sobretudo, sobretudo, devem ter uma postura recetiva para que quando as escolhas e objetivos dos alunos os coloquem numa situação de ensino-aprendizado de normas e culturas de espaços-alvo que desconhecem, tenham a modéstia de admitir o que não sabem e a aptidão de traçar o caminho de aprendizado desses alunos baseado nos interesses e objetivos deles; num processo em que tanto os alunos quanto os professores aprendem a reconhecer e descrever a variante-alvo, de uma forma purgada de preconceitos e estereótipos ou que se agarre a conceitos externos de “certo” e “errado”; que não passam de atitudes confortáveis e preguiçosas que tantas vezes pretende esconder ignorâncias inadmissíveis, mas que na realidade acabam por tornar o despreparo profissional tão embaraçosamente transparente.
Como posso abraçar a diversidade da língua portuguesa quando tenho tantas restrições em termos de conteúdo e avaliação? Se permitirmos que os alunos estudem e façam os seus trabalhos usando normas regionais ou de grupo além da norma-padrão, parece-me que permitiremos gramática e ortografia fora do padrão.
Comece pequeno. Se tem alunos de origens diferentes e que usam diferentes registos da língua portuguesa, o único factor da sua avaliação que precisa mudar (ou seja, tornar-se mais inclusivo) é “gramática e estilo”; todos os outros factores permanecem os mesmos (por exemplo, foco, desenvolvimento, eficácia). Classifique o conteúdo e o significado antes da estrutura gramatical. Responda ao significado que o aluno está a comunicar. À medida que o semestre avança, você pode focar na escrita dirigida principalmente a leitores da norma-padrão, e pode trabalhar com os alunos para que eles entendam as diferenças.
O primeiro desafio dos professores é convencer os alunos de que realmente desejam que eles escrevam usando o seu registo da língua materna (e vão ter que os convencer disso), e isso vai fazer com que eles explorem novos recursos de conteúdo. Isso é muito bom como primeiro passo. Depois do aluno ter o conteúdo, os professores podem ajudá-lo a moldar esse conteúdo. A escrita não tem que estar em conformidade com a norma-padrão do português para ser significativa, e temos muitos exemplos de escritores famosos que o fazem. Portanto, ajudar os alunos a escrever de forma significativa é uma grande parte do ensino da redação. Os professores podem ensinar foco, organização, desenvolvimento, argumento, descrição, análise, etc. sem nunca terem que comentar sobre gramática e ortografia.
Mas então quando é que os professores começam a trabalhar na gramática e em outras convenções?
Boa pergunta. Quando os professores determinam que um texto escrito é significativo, e quando os professores e os alunos sabem que o texto é direcionado para leitores que usam a norma-padrão, os professores podem começar a identificar padrões na gramática do aluno que não estão em conformidade com a norma-padrão. Devem fazer com que os alunos mantenham um caderno com esses padrões gramaticais, contrastando a gramática do registo do aluno com a gramática padrão. Trabalhar com dois ou três padrões ao mesmo tempo é mais do que suficiente. Deixemos o resto em paz. É nesse momento que dizemos aos alunos que os leitores esperam uma linguagem “padrão” e que eles devem-se concentrar nos padrões gramaticais que foram apontados.
Agora, suponha que o aluno não quer mudar a linguagem da redação, e por boas razões? Suponha que o aluno quer usar o seu próprio registo do idioma, ao lado da norma-padrão do português. Se os professores realmente respeitam a legitimidade do registo dos alunos, devem permitir que o aluno use o seu próprio registo, contanto que os professores responsabilizem os alunos pelos padrões gramaticais identificadis. Escrever é fazer boas escolhas, e escolher envolve ter o domínio de mais de um estilo, ou seja, ter opções.
Uma sala de aula multilíngue e multirregisto não vai incentivar os alunos a permanecer na cultura da sua comunidade e ser um obstáculo ao acesso a uma cultura mais ampla?
Não. O sucesso dos alunos é incentivado ao permitir que eles usem o seu registo da língua materna para desenvolver as suas próprias ideias. Os alunos aprendem a acessar ao mundo mais amplo por meio das suas identidades locais e familiares; dá-lhes uma posição no mundo, e não uma desculpa para ficarem a olhar para o umbigo.
Os alunos precisam de saber quando podem negociar as suas escolhas e quando não podem, e as estratégias de ensino para lidar com essas escolhas são a recontextualização, encontrar a voz, interagir e a textualização.
A maioria dos meus alunos são falam e escrevem na norma-padrão do português. Por que é que tenho que me preocupar com outras variedades do idioma?
Mesmo as pessoas que usam a norma-padrão têm que se comunicar com pessoas que usam outros registos ou que usam o português como segunda língua, sobretudo com a crescente globalização e aproximação em locais de trabalho e comunidades. É necessário preparar os alunos para este mundo multilíngue, que incluí as variedades locais e regionais da língua portuguesa, as variedades nacionais e internacionais da língua portuguesa, em que o português é usado de acordo com vários conjuntos de regras e padrões. Além disso, mesmo os que falam e escrevem na norma-padrão estão familiarizados com outras variedades do português nos seus ambientes domésticos e comunitários que podem utilizar, e é importante que os alunos considerem que o seu público não vai ser sempre consistuído exclusivamente de falantes do português padrão (português/brasileiro/angolano/moçambiqcano etc.). Uma abordagem multilíngue é especialmente importante pela abertura às diferenças no idioma. Ter consciência da diversidade linguística é fundamental para evitar que os falantes da norma-padrão criem suposições sobre outros registos e assumam que qualquer coisa diferente da norma-padrão é inferior; a conscientização vai garantir que eles vejam as alternativas à norma-padrão como sistemas comunicativos complexos e eficazes, e como recursos em vez de deficiências. Mesmo que o aluno não esteja necessariamente a usar ou aprender outra variedade da língua na escrita, a exposição e o respeito a outras variedades é importante para evitar preconceitos linguísticos.
Como posso equilibrar por um lado o respeito e reconhecimento da diversidade da língua portuguesa, e por outro, dar aos alunos o tipo de ensino da escrita que os vai beneficiar no futuro? Os meus alunos não precisam de conhecer as regras do português padrão para terem sucesso na universidade e no mundo do trabalho e dos negócios?
Esta é uma das questões fundamentais a considerar enquanto nos esforçamos para ser mais inclusivos no nosso ensino de escrita e redação. Podemos enfrentar resistência de colegas, de outras partes interessadas e até mesmo dos nossos próprios alunos à medida que promovemos a validade e a relevância dos registos domésticos e comunitários que os alunos trazem com eles para a sala de aula. Muitos alunos vão dizer que é a norma-padrão que promove a mobilidade social e ajuda na busca de emprego. Há um lugar para o ensino das normas do português académico, mas é possível moldar o ensino da escrita de modo a que não apresente uma "forma correta" imóvel de escrever em português.
Quando abraçamos o ensino inclusivo, capacitamos os alunos, reconhecendo e valorizando os recursos linguísticos que eles trazem para a sala de aula. Esse empoderamento pode significar a diferença entre o sucesso na universidade e "passar despercebido" para alguns alunos, o que, por sua vez, ajudará a criar futuros líderes mais estão cientes e abertos à diversidade linguística entre os seus próprios alunos, funcionários e colegas de trabalho . Se quisermos respeitar todas as variedades do português que os alunos trazem para a sala de aula, temos que dar o exemplo e não só falar por falar. Tudo se resume a isto: devemos preparar os alunos para os preconceitos do presente ou trabalhar para criar um futuro diferente? Mesmo passos pequenos e bem pensados em direção à inclusão linguística na sala de aula, vão ajudar a quebrar a longa tradição de elitismo nas questões da língua e mudar o status quo!
Mas eu realmente preciso de saber mais sobre sociolinguística?
Em geral, a sociolinguística estuda como a língua e as situações sociais interagem. Foi por meio da sociolinguística que passou a haver uma apreciação pelas variedades linguísticas, frequentemente vistas como inferiores ou impróprias, como o português açoreano, o mineirês, o português de Angola, o portuense, os falares nordestinos, ou mesmo o crioulo caboverdiano. Como os alunos têm origens linguísticas diferentes, aprender mais sobre sociolinguística certamente ajudará no momento de responder aos textos dos alunos. Ter uma compreensão básica das diferentes variedades do português é condição básica para os professores poderem entender a diferença entre o erro e o próprio registo do aluno. Por exemplo, um aluno que fala principalmente português gaúcho demonstrará diferentes padrões gramaticais que podem ser transferidos para a sua escrita. Ao conhecerem algumas das características gramaticais do português gaúcho, os professores serão capaz de ver quando o aluno cometeu um erro, em oposição a quando o aluno tomou a decisão de usar o seu próprio registo.
Quais são algumas considerações sobre raça e poder que os professores enfrentam ao lidar com a variação linguística na sala de aula?
A língua pode ser uma questão delicada, mas a diversidade linguística pode ser abordada em sala de aula sem a preocupação com raça ou poder. Faz sentido incluir todas as variedades da língua -- os alunos adquirem a norma-padrão do português ao mesmo tempo passam a entender o seu próprio registo. A norma-padrão é apropriada para algumas situações e inapropriada para outras. Como abordagem de ensino, os alunos devem poder produzir na língua de acordo com seu público e propósito, em vez de terem um mandato anterior -- os alunos devem ter a liberdade de fazer escolhas retóricas em sala de aula.
A mistura de registos ajuda com as questões subjacentes a raça e poder nas nossas salas de aula. Misturar os registos apresenta uma visão alternativa da língua e oferece aos alunos um caminho mais igualitário para a norma-padrão do português, uma rota que integra o português académico com seus próprios dialetos e que simultaneamente busca acabar com a discriminação.
Por que deveríamos ensinar variedades vernáculas ou regionais se os alunos já as usam?
Na se trata de ensinar estes registos aos alunos, mas antes reconhecer e respeitar as línguas maternas de todos os alunos e permitir que os alunos as utilizem como fontes e inspiração para uma melhor escrita. O mal-entendido de que os alunos são ensinados a usar variedades da língua em lugar da norma-padrão tem sido perpetuado por opiniões mal informadas.
Quando a identidade de um aluno é afirmada por meio da legitimação de sua língua materna, o aluno tem autonomia para alcançar e, no caso da escrita, aprender como aproveitar o discurso do português padrão académico. No caso das variantes da língua, o que realmente está a ser ensinado é as suas legitimidades gramaticais; aos alunos é mostrado que eles seguem regras, mas não as mesmas que a norma-padrão do português segue. Quando reconhecemos uma variedade de língua como válida em si - muito mais complexa do que um português padrão incorreto ou informal e como mais do que uma gíria - os alunos podem ser encorajados a se basear nas nuances da sua variedade, até mesmo a serem inspirados por ela, à medida que se esforçam para escrever de uma forma que seja verdadeiramente significativa e atraente para o seu público.
Os meus alunos não precisam de saber a gramática do português padrão?
Os alunos precisam de aprender a gramática do português padrão até certo ponto. No entanto, deve ser mais importante que os alunos aprendam como decidir quais situações exigem o português padrão e quanto a mistura de registos é aceitável. Cada vez mais, o português padrão é considerado “o idioma de comunicação mais ampla”, e não a maneira “certa” de escrever. Os alunos precisam de aprender a ter consciência das suas escolhas retóricas.
Como se pode esperar que um professor de português ou de escrita aprenda todas os registos que os seus alunos falam em casa? Como é que alguma vez teriam tempo para ensinar?
O professor não precisa de conhecer os registos de todos os alunos; em vez disso, o professor deve respeitá-los e familiarizar-se com eles, permitindo que os alunos aprendam mais sobre as sua própria língua, explicando as suas regras e usos ao professor. O professor concentra-se mais na transmissão de ideias para um público específico e ajuda os alunos a aprender como usar os seus registos ou dialetos para chegar lá.
Se a norma-padrão do português é tão opressiva, por/para que ensiná-la? O que devo ensinar?
A estratégia de cada professor pode variar um pouco no momento de decidir o que ensinar na sala de aula. Comece pequeno - ensine da perspectiva da norma-padrão do português como uma variedade da língua portuguesa, e considere convidar os alunos a explorar diferentes materiais. Existem muitas variedades de português que são usadas em textos publicados, não apenas a nomra-padrão do português. À medida que nossa cultura se torna mais diversa, a nossa norma-padrão deve refletir essa diversidade, e é para lá que vamos - na ficção e não-ficção. O que é "opressivo" na norma-padrão do português é o ensino que induz os alunos a acreditar que apenas a norma-padrão conta, que se eles não aprenderem as regras, não saberão escrever. Ser honesto sobre a linguagem e praticar o que os sociolinguistas nos ensinaram sobre as diferentes variedades ajudará muito os alunos a compreender a língua e o papel da norma-padrão, mesmo que seja um híbrido que inclua alguma mistura de registos. Afinal, os alunos aprendem com o tempo - anos, até décadas. Portanto, não faz sentido insistir que eles aprendam a produzir artigos perfeitos em um semestre. Faz mais sentido ensiná-los a comunicar as suas ideias em uma redação bem desenvolvida e focada, que também mostra uma consciência crescente do público e do propósito.