Cada 25 de Abril vejo comentários fascistoides de compatriotas desenganados
Cada 25 de Abril vejo comentários fascistoides de compatriotas desenganados e, apesar de entender as suas frustrações, não vou pedir desculpas pela Revolução. Já sei, dizem as más-línguas que a classe política portuguesa é corrupta… que os políticos portugueses são uns vassalos de interesses europeus... que vendem o futuro do nosso país e dos nossos cidadãos por uma pataca e meia… se calhar estão certos, o mais provável é serem línguas boas e certeiras.
Entendo que a desilusão seja muito grande e a muitos níveis, mas mesmo assim, não vou pedir desculpas pela Revolução, até porque o passado de políticos impolutos, com o interesse nacional em primeiro plano e comprometidos com o futuro da nação e dos portugueses é uma fantochada atrás da qual se escondem autoritarismos melindrados.
De vez em quando, aparecem mesmo uns espetros a falar saudosamente do tempo da outra senhora. Agradeço, mas se não quisesse ter voz política ou liberdades civis ia viver para a Coreia do Norte, que é o que aconselho que todos os saudosos façam, porque eu não vou mesmo pedir desculpa pela nossa Revolução, nunca vou pedir desculpa pela Democracia Portuguesa, nem vou maldizer as prerrogativas a que legitimamente tenho (temos) direito como ser humano.
Vivemos em tempos muito mediáticos em que a governação é um espetáculo de desgraças. É perfeitamente razoável que os cidadãos portugueses as vejam repetidamente e se sintam traídos pelas gestões danosas de várias administrações, e pela falta de responsabilização e criminalização de muitas das desastrosas políticas que empurraram tantas famílias portuguesas para o colapso financeiro. Entendo que esta displicência corroa o nosso comprometimento democrático, e que nos momentos de crise a nossa psique coletiva traumatizada pela ditadura pareça ter uma tendência para a idolatria de personalidades. No entanto, temos que voltar à nossa sanidade comum e fugir às demagogias fáceis que só nos enterram ainda mais. A solução não é entregar as conquistas democráticas, a solução é envolvermo-nos ainda mais no processo político nacional. Não basta votar, e muitos não votam, é preciso que mais cidadãos se apresentem como candidatos de alternativa em todas as eleições.
O velho clichê diz que cada povo tem os políticos que merece, mas nós merecemos melhor. Precisamos honrar as mulheres e homens torturados e mortos pela polícia política para que num futuro que eles não tiveram a oportunidade de viver, pudéssemos nós portugueses decidir o nosso destino coletivo. Por isso, não vou, não vou, não vou mesmo pedir desculpas pela Revolução. Antes, peço desculpas pelas más-línguas que se esquecem que o 25 de Abril não nos devolveu só a voz para falar, mas também nos deixou os mecanismos políticos para participarmos das soluções. Viva o 25 de Abril, hoje e sempre!